terça-feira, 21 de julho de 2009

Momento em casa: O pôr do sol e a orquídea


O sol estava se pondo. O pôr do sol a fez lembrar-se do seu pai. E ela começou a falar.

Ele estava mortalmente enfermo e sabia disso. Ela abandonou o seu trabalho para estar com ele. E conversaram sobre a partida que se aproximava, tranquilamente. Aqueles que aceitam a chegada da morte ficam tranquilos.

Disse-me que a hora que seu pai mais amava era o crepúsculo. Desde menina, ele se assentava com ela e ia mostrando a beleza das nuvens incendiadas, a progressiva e rápida sucessão das cores: azul, verde, amarelo, abóbora, vermelho, roxo...

À medida que a morte se aproximava, a fraqueza aumentava. Mas, mesmo fraco, queria ver o pôr do sol. Talvez pela irmandade de um homem que morre e um sol que se põe.

Numa dessas tardes, ela não conseguiu conter as lágrimas. Chorou. Ele a abraçou e colocou seu dedo sobre seus lábios. “Não quero que você chore...” E, apontando para o sol que se punha, disse: “Eu estarei lá...”

E contou-me também de uma orquídea que silenciosamente acompanhou esses momentos de despedida. A orquídea, depois que seu pai partiu para o pôr do sol, se recusou a parar de florir...
Será que o seu pai foi morar na orquídea? É possível...


* * *


O belo texto de Ruben Alves aborda, com delicadeza, uma temática muito comum nos textos espíritas.

A Doutrina dos Espíritos tem como arcabouço maior a imortalidade da alma. Foram as vozes dos Imortais que se fizeram ouvir através da mediunidade segura e confiável de jovens francesas.

Foram essas vozes que bradaram: A morte não existe! Estamos aqui! Mais vivos do que nunca! Estamos no pôr do sol.

E foram esses Espíritos, almas que já haviam vivido na Terra, que iniciaram o processo de elaboração da chamada Codificação Espírita.

A autoria do Espiritismo é dos Espíritos em conjunto com Kardec. Foram os seres que já se encontram no pôr do sol que anunciaram verdades confortantes aos amigos encarnados na Terra.

A orquídea que nunca deixa de florir é similar à alma humana. Nunca deixa de existir, nunca deixa de crescer e florescer.

Haverá dia em que iremos encarar a morte de forma diferente. Uma separação temporária que, às vezes, nem mesmo separação o é – se considerarmos que entre almas não necessita haver afastamento.

O amor não se perde nunca, pois ele não está no outro, está em nós. O ser amado ora está aqui, ora acolá, nesses tantos ir e vires da vida, mas isso não faz o amor fenecer nem desistir de amar.
O amor, por ser criação de Deus - como tudo, Nele confia sempre. Nele se fortalece.

Que as inevitáveis separações da vida possam ser vistas de ângulos diferentes daqueles de sempre. Não perdemos ninguém, pois a ninguém possuímos na verdade. Ninguém deixa de existir, pois a morte não existe. É apenas um momento de transição de um estado de vida para outro. Todos vivem. Todos viveremos.


Redação do Momento Espírita, inspirado no texto
O pôr do sol e a orquídea, do livro Ostra feliz não
faz pérola, de Rubem Alves, ed.Planeta.
Em 21.07.2009.
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Foto: Rosy Butterfly, de secondclaw - do site deviantart.com

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